PERGUNTA: Como algo pode ser considerado uma “decisão de assembleia” quando muitos
na assembleia não concordam com ela?
RESPOSTA: Talvez eu deva fazer alguns comentários sobre como
uma “decisão de assembleia” é formulada, antes de responder a essa pergunta.
Quando surgem
problemas e é preciso um julgamento ou ação administrativa em um caso que chega
diante da assembleia, os irmãos responsáveis se reúnem separadamente da assembleia
para ter um entendimento dos fatos e examinar as Escrituras para determinar o
que a assembleia deve fazer. Esse princípio é visto em Atos 15. Embora o que
aconteceu em Atos 15 não fosse exatamente uma reunião local de “cuidados” da forma
como a conhecemos, já que era uma reunião de irmãos de várias localidades
diferentes, a passagem estabelece o princípio de que os assuntos podem ser examinados
pelos irmãos responsáveis separadamente da assembleia como um todo. Ali diz, “Congregaram-se,
pois, os apóstolos e os anciãos para considerar este assunto” (At 15:6). Note que não é
mencionada a presença das irmãs, irmãos jovens e novos convertidos. As coisas não
devem ser discutidas em detalhes diante de toda a assembleia, porque pode haver
algum debate (At 15:7) que não seria de boa ordem para uma reunião pública. Além
disso, algumas coisas que podem contaminar poderiam ser abordadas e não seriam
apropriadas em tal ambiente (1 Co 14:40).
O modo normal
do Senhor guiar a assembleia local em um caminho bíblico e em suas
responsabilidades administrativas é por meio daqueles que “tomam a liderança” (1 Ts 5:12-13; Hb 13:7, 17, 24; 1 Co
16:15-18; 1 Tm 5:17 – JND). Tomar a liderança, nessa função, não se refere a
liderar no ensino ou na pregação públicos, mas aos assuntos administrativos da assembleia.
Confundir as duas coisas é não entender direito a diferença entre dom e ofício.
Alguns dos que “tomam a liderança” podem nem sequer ensinar publicamente, mas é muito bom e de ajuda
quando podem (1 Tm 5:17). Esses homens devem conhecer os princípios da Palavra
de Deus e ser capazes de expô-los para que a assembleia possa entender o curso
de ação que Deus gostaria que ela tomasse em um determinado assunto (Tt 1:9). Esses
homens não nomeiam a si mesmos para esse papel, mas são levantados pelo
Espírito Santo para esse trabalho (At 20:28). Eles serão reconhecidos pela assembleia
como pessoas que se entregaram ao cuidado dos santos, por seu conhecimento de
princípios e por demonstrarem possuir experiência e julgamento sadios.
Existem três
palavras usadas nas epístolas para descrever esses líderes responsáveis na
assembleia local:
- Primeiramente, “anciãos” (presbuteroi)
refere-se àqueles avançados em idade, o que implica maturidade e experiência. No
entanto, nem todos os homens mais velhos na assembleia atuam necessariamente no
papel dos líderes (1 Tm 5:1; Tt 2:1-2).
- Em segundo lugar, “bispos” ou supervisores (episkopoi) refere-se ao trabalho que eles fazem, que é pastorear
o rebanho (At 20:28; 1 Pe 5:2), velando pelas almas (Hb 13:17) e fazendo
admoestações (1 Ts 5:12).
- Em terceiro lugar, eles são chamados de “guias” (ARA) ou líderes (hegoumenos); isso se refere à sua capacidade espiritual de liderar os santos.
No livro de
Apocalipse, os que estão nesse papel são chamados de “estrelas” e de “o anjo da igreja [local]” (Ap 1-3). Como “estrelas”, eles devem dar testemunho da verdade de Deus (os
princípios de Sua Palavra) como portadores de luz na assembleia local, fornecendo
luz sobre diversos assuntos com os quais ela possa ser confrontada. Isso é
ilustrado em Atos 15. Embora não esteja relacionado exatamente com “ligar” e
“desligar”, aprendemos princípios valiosos da função administrativa na Igreja. Depois
de ouvir o problema que estava afligindo a assembleia, Pedro e Tiago lançaram
luz espiritual sobre a questão. Tiago aplicou um princípio da Palavra de Deus e
emitiu seu julgamento sobre o que ele acreditava que o Senhor gostaria que eles
fizessem (At 15:15-21). Como “o anjo da igreja”, os que estão nesse papel devem atuar como
mensageiros para prover a mente de Deus na assembleia ao executar a coisa. Isso
também é ilustrado em Atos 15:23-29.
Quando esses
irmãos sentirem que discerniram a mente do Senhor, a partir das Escrituras, quanto
ao que a assembleia deve fazer em um determinado caso que está diante deles,
então eles trazem os fatos (não necessariamente os detalhes, pois estes
poderiam contaminar) e as conclusões bíblicas diante da assembleia para que a
consciência de todos possa estar engajada na questão (At 15:22). Então torna-se
uma decisão ratificada, ligada (Mt 18:18-20). Ela é chamada de “decisão de assembleia”
porque é feita em assembleia – isto é, quando a assembleia está reunida como tal, com o Senhor no
meio (1 Co 5:4) –, e não porque todos na assembleia concordam.
Tem sido perguntado:
“Quem decide o que deve ser feito em um determinado caso que chega diante da assembleia?”
Nossa resposta é: o Senhor. Ele é a Cabeça da Igreja, e a assembleia deve tomar
sua direção d’Ele (Cl 2:18). Os irmãos responsáveis podem ter que examinar uma questão
para obter os fatos, mas, depois de serem apurados, a Palavra de Deus decide o
que deve ser feito.
Alguns têm o
pensamento de que os irmãos devem simplesmente formular uma proposta para a assembleia
e, quando a trouxerem para a assembleia, a assembleia como um todo então
decide. Isso é democracia, e as ações da assembleia não são executadas por meio
de princípios democráticos. Os irmãos que “tomam a liderança” são responsáveis
por garantir que a assembleia seja guiada em um curso de ação fundamentado na
Escritura, independentemente de todos na assembleia concordarem ou não. Se não
fosse assim, então os irmãos responsáveis mais velhos (que entendem os
princípios e sabem o que deve ser feito) poderiam ter seu julgamento piedoso e
fundamentado na Escritura impedido pelas irmãs e pelos neófitos, ou por
partidários do transgressor que está sendo julgado. Isso significa que um
julgamento fundamentado na Escritura ficaria sujeito àqueles que têm pouca
experiência, ou conhecimento, ou talvez influência em questões de assembleia. Certamente
algo assim não estaria correto. Alguns parecem achar que os irmãos não podem
agir até receberem o “OK” dessas pessoas, mas isso equivale ao povo controlando
seus líderes e é o princípio em que a democracia está enraizada. Muitos
tropeçaram exatamente nisso quando os anciãos procuraram realizar um julgamento
bíblico, e alguns discordaram da ação.
Isso não quer dizer que os anciãos tomam as decisões
administrativas na assembleia e o resto dos santos não tem nenhuma participação.
É possível irmãos mais jovens terem a mente do Senhor em uma questão em que os
irmãos mais velhos talvez a tenham deixado passar (Jó 32-33). Em tal caso, os
irmãos mais velhos devem ficar felizes em aceitar luz sobre uma questão que
eles podem não ter visto. Mas na vida normal de assembleia, os irmãos mais
velhos e experientes que entendem os princípios envolvidos são aqueles que têm
o peso moral nessas questões de assembleia.
Nada pode ser oficialmente decidido sem que a assembleia tenha
a oportunidade de ter a sua consciência exercitada no assunto, e é por isso que
os anciãos devem procurar atingir a consciência de todos na assembleia,
trazendo-o diante deles (At 15:22). Os irmãos responsáveis devem ser sensíveis
a qualquer objeção legítima que alguém da assembleia possa ter. Mas, no final, será
deles a responsabilidade, como “o anjo”
da igreja, de agirem para a glória de Deus (Ap 2-3). Mas não é uma decisão da
assembleia até que seja feita na assembleia, no
que às vezes é chamado de reunião para disciplina (Mt 18:19-20; 1 Co 5:4).
Ao formularem as decisões de assembleia, os líderes
responsáveis devem procurar alcançar a consciência
de todos na assembleia local para que todos possam ser exercitados no assunto;
no entanto, a assembleia pode não seguir a consciência
de alguns. Como mencionado, isso porque eles podem ser jovens na fé cuja
consciência pode não estar suficientemente instruída em princípios bíblicos
para ser capaz de formar um julgamento correto. Eles poderiam ser mundanos e
não ter o discernimento espiritual, ou eles poderiam ser tendenciosos no
assunto. Em qualquer caso, o julgamento deles deve ser desconsiderado. A Escritura
não exige que haja um “De acordo.” de todos na assembleia antes que possa ser
uma decisão legítima.
Nestes últimos dias, quando a vontade do homem está cada vez
mais evidente em se impor na igreja, não podemos esperar conseguir unanimidade
em julgamentos de assembleia. Foi assim no julgamento em Corinto. 2 Coríntios
2:5 diz, “Se alguém tem causado tristeza, tem causado tristeza
não a mim, porém em parte... a todos vós”
(TB). Aparentemente, nem todos na assembleia de Corinto ficaram tristes com o
pecado em seu meio. Mesmo assim, a assembleia ainda executou a ação para a
glória de Deus.
Ao lidar com uma situação de heresia, você raramente – talvez
nunca – irá conseguir a aprovação da pessoa que está sendo julgada pela assembleia.
Além disso, membros da família e simpatizantes podem se opor, então geralmente
não haverá unanimidade. J. N. Darby disse, “A unanimidade é absurda, uma
negação do poder e da operação do Espírito, e completamente contrária à Palavra
de Deus. Primeiro, ela é absurda, pois até que o caso seja decidido, a pessoa que
está sendo acusada faz parte da assembleia, e você não vai conseguir fazê-la
concordar, como se conduzida pelo Espírito, em julgar seu próprio caso.”
Ocasionalmente decisões foram tomadas pela assembleia quando
alguns irmãos não estavam na reunião local de cuidados, ou na reunião de assembleia
onde a decisão foi tomada. Isso levou alguns a pensarem que essa não poderia
ser uma genuína decisão de assembleia ratificada no céu. Eles bradam, “Mas nem todos
os irmãos estavam lá para decidir!” Mais uma vez, essa é uma ideia democrática.
A assembleia agindo em sua capacidade administrativa sem a presença de todos
não é algo incomum na Escritura. Vemos este princípio em 1 Coríntios 15:5, em
relação ao ofício do apostolado. Ali diz, “E que foi visto por
Cefas, e depois pelos doze”. Quando comparamos
com Lucas 24:34-48 e João 20:19-24, descobrimos que havia apenas dez apóstolos
presentes quando o Senhor apareceu a eles; ainda assim, eles são chamados de “os
doze”! Judas tinha se enforcado e Tomé não
estava ali. De acordo com Atos 1, Matias ainda não era parte dos “doze”.
A eleição dele não ocorreu senão depois de o Senhor
ter completado todas as Suas aparições como ressuscitado (durante 40 dias) e
subido ao céu. Mesmo assim, aqueles reunidos são chamados de “os
doze”. Vemos com isso que “os
doze” é um termo usado para designar o ofício
administrativo que eles cumpriam e a autoridade que tinham para agir assim. Nas
epístolas aos Coríntios, onde são descritas a função e a ordem na assembleia, é
coerente que esse princípio seja ensinado ali. Algo digno de nota é que as
aparições do Senhor às mulheres não são citadas em 1 Coríntios 15, pois a
administração da assembleia é confiada aos irmãos responsáveis. Isso mostra que
a assembleia, atuando em sua capacidade administrativa, não precisa da presença
de todos antes que suas ações sejam ligadas.
A assembleia não é uma
instituição democrática que toma suas decisões pelo voto majoritário, com todos
tendo direitos iguais de opinar sobre o assunto. Uma vez ouvimos um irmão mais jovem
dizer, “Eu tenho tanto direito de opinar aqui quanto ele”,
referindo-se a um irmão mais velho sério e piedoso que tinha se dedicado ao
cuidado da assembleia por 50 anos. Tivemos que dizer a ele que aquilo
simplesmente não era verdade. Existe algo chamado peso moral, e isso é obtido com
anos de fiel andar com o Senhor e cuidado com os santos. Aqueles que ocupam uma
posição de liderar e guiar a assembleia carregam a maior parte do peso da
assembleia em seus assuntos administrativos. Por exemplo, pode haver um caso em
que seis ou sete irmãos mais jovens queiram fazer uma determinada coisa, mas
três ou quatro irmãos mais velhos sérios sintam de outra forma. Como o
julgamento dos irmãos mais velhos deve ser respeitado, por carregarem o peso
moral na assembleia, o Senhor espera que os irmãos mais jovens se sujeitem ao
julgamento dos mais velhos sobre a questão, se ele for diferente. Eles deveriam
ficar felizes em seguir a direção espiritual apontada por seus irmãos mais
velhos.
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RESUMO:
A resposta rápida quanto a nem todos concordarem em uma ação da assembleia é
que a assembleia não é uma democracia, e não é preciso unanimidade para que uma
decisão de assembleia seja ligada. Aqueles que tomam a liderança carregam a
maior parte do peso nas ações administrativas da assembleia. Eles são
responsáveis por garantir que a assembleia caminhe de forma bíblica, quer todos
concordem ou não com uma determinada decisão.
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